O Pró-Brasil deverá contar com investimentos públicos de, ao menos, R$ 1,8 bilhão no projeto de duas ferrovias, a Fico (Ferrovia de Integração do Centro-Oeste) e a Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste). Com isso, espera atrair R$ 15,5 bilhões em investimentos privados até 2023.
Mantido em sigilo pela Casa Civil, o plano terá como pilares obras públicas e privadas e mudanças legais levadas adiante primordialmente pelos ministérios da Infraestrutura e do Desenvolvimento Regional. A Folha teve acesso a parte do material que será apresentado por Bolsonaro no lançamento do programa, ainda sem data definida.
O investimento público em ferrovias consta como carro-chefe para a criação de um novo corredor logístico no país –o que o ministro Tarcísio de Frei- tas (Infraestrutura) considera uma herança de sua gestão.
Para viabilizá-lo, precisa concluir a construção de um dos trechos da Fiol e financiar o projeto executivo da Fico. Esse mecanismo de investimento cruzado está previsto em lei de 2017, mas sua regulamentação só saiu em 2019.
Tarcísio, que ajudou nesse projeto de lei quando atuava pelo PPI (Programa de Parcerias de Investimentos) na gestão Temer (MDB), foi o grande defensor da regulamentação como ministro de Bolsonaro.
O primeiro caso a usar o mecanismo de investimento cruzado deverá ser o da Fico, cujo projeto de seu primeiro trecho foi aprovado pelo Tribunal de Contas da União em agosto.
A construção da Fico será uma exigência de investimento do governo pela renovação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Vitória-Minas, administrada pela Vale.
Cerca de R$ 4 bilhões do total da outorga a ser cobrada pela prorrogação serão parcialmente usados como investimentos na construção da ferrovia, que, estima-se, deve ficar pronta em até cinco anos.
Quando for entregue, a União poderá preparar um leilão e concedê-la à iniciativa privada. Caso tenha interesse, a Vale poderá entrar na disputa.
Espera-se que a concessionária tenha de pagar algum valor ao governo, dinheiro que deverá ser usado na conclusão do trecho da Fiol que liga Caetité a Barreiras, na Bahia.
O governo espera contar com ao menos R$ 1 bilhão vindos da prorrogação de contratos.
Os demais trechos devem ser construídos pela concessionária da FCA (Ferrovia Centro-Atlântica), controlada pela Vale, como contrapartida pela prorrogação antecipada de seu contrato. Parte desse trecho já está pronta. Até o momento, as obras foram conduzidas com recursos da Valec, estatal que constrói ferrovias.
No documento a que a Folha teve acesso, o governo informa que o país ocupa uma posição ruim na lista dos países com a melhor malha de infraestrutura e “que ampliar e modernizar a malha ferroviária é uma prioridade do programa Pró-Brasil”.
Com as obras e mudanças de regras regulatórias, o governo pretende atrair até R$ 83 bilhões em investimentos, dos quais R$ 15,5 bilhões sob o comando de Bolsonaro.
Ainda segundo o governo, as principais cargas movimentadas por ferrovias no país são de ferro (70%) e grãos (15%), além de outros produtos como combustíveis, fertilizantes e contêineres, mas nem todas as regiões produtoras são plenamente atendidas por ferrovias –como o norte e meio-norte de Mato Grosso (grãos) e o oeste da Bahia (reservas de minério).
Com a implementação da Fer- rogrão, Fico, Fiol e Ferroeste, o país terá novos corredores logísticos, aumentando a relevância nas exportações do Matopiba (região com áreas de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) e de Mato Grosso dos atuais 36% para 72%, além de viabilizar a exploração de novas minas de ferro na Bahia.
O plano também prevê prorrogações antecipadas da Malha Central e da Malha Norte. A renovação antecipada da Malha Paulista, controlada pela Rumo, foi assinada em maio.
Há ainda investimentos remanescentes de concessões vigentes, de R$ 4,3 bilhões.
Para a criação dos corredores logísticos, o governo pretende alterar, basicamente, duas leis: a da cabotagem e a dos portos. A primeira já foi enviada ao Congresso, mas há resistência na Câmara porque, ao abrir o mercado de navegação, prevê a preferência dos rios em vez das rodovias, o que deve derrubar o preço do frete dos caminhoneiros.
Já nos portos, as mudanças tornam mais claras as novas regras que, ao menos em Santos (SP), já causam conflitos entre donos de armazéns e a administração portuária.
Inicialmente pensado como um grande programa de obras públicas, o Pró-Brasil passou a ser um misto de investimentos do Tesouro com diversas iniciativas regulatórias. Também são discutidas possíveis alterações em telecomunicações e energia.
Procurado, o Ministério da Infraestrutura disse que o Pró-Brasil está sob a tutela da Casa Civil e que subsidia a pasta na concepção do portfólio de investimentos públicos, privados e na reforma do ambiente de negócios para o setor.
JULIO WIZIACK E FÁBIO PUPO (FOLHAPRESS)
BRASÍLIA, DF